Em Brasília, segundo a última Companhia de Planejamento do Distrito Federal – Codeplan, 40,73% dos responsáveis pelos domicílios do Plano Piloto são do sexo feminino. Ao mesmo tempo, a participação das mulheres no mercado de trabalho aumentou 4,5% entre 2000 e 2010. Esse cenário acarretou mudanças que interferem na vida do cidadão comum. Hoje, uma família tradicional não é só aquela que tem a figura do pai como chefe. Atualmente, é grande o número de mulheres que ocupam esse espaço, que sentam à cabeceira da mesa, impõem as regras, pagam as contas e têm a palavra final nas decisões.
O IBGE divulgou que no espaço urbano 40,7% das mulheres contribuem para a renda das casas, contra os 42,4% delas no rural. A socióloga Ana Liési Thurler, especialista em estudos femininos, pesquisadora e consultora em Direitos Humanos das Mulheres, explica que o crescimento permanente das famílias monoparentais, com a mulher como responsável por esses núcleos, ocorre por diversas razões. Entre elas, a maior escolaridade da mulher e seu ingresso maciço no mercado trabalho. “Hoje somos praticamente a metade da população economicamente ativa”, ressalta a socióloga. A autonomia feminina é a chave do crescimento de mulheres à frente das famílias. “Mesmo em estruturas convencionais de matrimônio, a mulher tem uma participação significativa, deixando para trás a situação de subordinação”, explicou.
Para ser a pessoa responsável pelo domicílio, é indiferente ter conhecimento sobre o estado civil. Chefe de família é aquele reconhecido assim pelos demais integrantes da família, independentemente do rendimento e da ocupação. De acordo com pesquisa feita pelo IBGE entre 2000 e 2010, a quantidade de domicílios chefiados por mulheres nesse período aumentou 13,8%. Em 2000, as mulheres eram responsáveis por 24,9% das 44,8 milhões de casas. Já em 2010, 38,7% das 57,3 milhões de habitações tinham a mulher como chefe da casa. Embora na área rural o cenário seja diferente – lá, apenas 24,8% das mulheres são responsáveis pela família –, sua participação na renda dos lares é maior.
Separação
Segundo dados do IBGE, no Brasil, quando a mulher e o homem vivem sob o mesmo teto, elas são as responsáveis pelo lar em 22,7% das residências. Quando os casais não vivem juntos e apenas um deles mora com os filhos, 87,4% dos lares são chefiados por elas. De um lado, representando os 22,7%, um exemplo é Marcela Moraes, 54, casada desde os 17 anos de idade e que durante os dois primeiros anos do casamento cuidou apenas da casa e dos filhos. “Casei muito nova. Na época, não trabalhava nem estudava. Dois anos depois, apareceu uma oportunidade de emprego, e fui à luta”. Segundo conta, o marido, que até então era o ‘provedor’, começou a repassar responsabilidades financeiras. “Não de cara, mas sutilmente. De repente, no dia de fazer as compras do mês, ele dizia não ter dinheiro naquele momento, pedia que eu pagasse e asseverava que depois me restituiria, mas nunca restituiu. Em seguida, vieram as despesas com os filhos e com a empregada. Quando vi, estava bancando tudo”, relembra Marcela.
De outra forma, a funcionária pública Joana Almeida, 51, faz parte dos 87,4% que são divorciadas. “Durante o casamento, as despesas foram divididas igualmente. Quando nos divorciamos, fiquei um pouco assustada com as contas”, relatou. A questão financeira pesou no começo para Joana porque antes eram dois salários e, depois da separação, era apenas um e mais uma ajuda do ex-marido. Porém, a servidora pública já estava acostumada a dividir seu tempo entre trabalho, casa, filhos e responsabilidades de dona de casa. Depois do choque do divórcio, o posto de responsável pelo domicílio não a assustou. “Comecei a perceber aos poucos que eu dava conta de tudo. Hoje eu sou feliz porque consegui dar para os meus filhos uma vida digna e não senti falta, no final das contas, do meu companheiro”.
Na periferia, desigualdade é maior
Todavia, a vida das mulheres que decidem ser responsáveis pelo domicílio ou que acabam ocupando o cargo sem planejar está longe de ser um mar de rosas. Afinal, apesar do aumento do número de mulheres no mercado de trabalho e da diminuição da diferença salarial média entre eles e elas, o sexo feminino ainda enfrenta dificuldade de ser promovida e bem remunerada. Para alguns, isso pode parecer fora da realidade atual, mas, de acordo com a pesquisa realizada pela Codeplan, a diferença salarial média entre os gêneros que trabalham no Plano Piloto é de 17%. Essa desigualdade é ainda maior na região administrativa da Fercal, a 30 km do centro da capital onde os homens recebem até 46% a mais.
Ainda segundo a pesquisa, a renda média mensal da mulher no Distrito Federal é de R$ 2.680, enquanto a dos homens tem o acréscimo de quase um salário mínimo, totalizando R$ 3.439. Dessa forma, embora as mulheres estejam conquistando mais espaço dentro e fora de casa, a batalha entre os gêneros ainda não terminou.
Ainda segundo a pesquisa, a renda média mensal da mulher no Distrito Federal é de R$ 2.680, enquanto a dos homens tem o acréscimo de quase um salário mínimo, totalizando R$ 3.439. Dessa forma, embora as mulheres estejam conquistando mais espaço dentro e fora de casa, a batalha entre os gêneros ainda não terminou.
O psicólogo Marcus Vinicius Leite explica que o fato de as mulheres serem responsáveis pelo lar é um aprendizado para o homem. Quando o homem não trabalha ou trabalha menos, ele pode passar pela experiência de dono de casa e enxergar o outro lado da moeda. Ainda assim, o psicólogo alerta que parte dos homens não enxergará a vivência como aprendizagem, mas, sim, como um rebaixamento. “O aumento das mulheres chefes de família pode provocar um sentimento de inferioridade no homem. Na maioria dos casos, o homem foi criado para ser o provedor. Dessa forma, problemas podem ser gerados quando o caso é invertido", explica o psicólogo. Para o advogado Mauro Ferreira, 37, casado desde 2006 e pai há três anos, nenhum problema foi causado. “Não acho que o papel do homem precise ser o de patriarca da família. O casal usufrui os bens e tem gastos, quando ambos trabalham e têm condições financeiras, dividir é natural. Na minha família, minha esposa e eu dividimos as contas e as responsabilidades. É a nossa casa e somos responsáveis. Nós dois decidimos juntos quando o assunto é a nossa filha”.
Por Fernanda Roza e Mariana Lyrio – Esquina Online