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Pedagogos ensinam valores que fogem da educação tradicional



Educar é sinônimo de sorrir

Foto: Íris Cruz



Assim como  amor, a sabedoria está no berço de criação. É do colo familiar que as crianças colhem o fruto do conhecimento e se preparam para viver e conviver em comunidade. Diferente do que o modelo de ensino tradicional mostra para os estudantes, a inteligência não está em uma pesquisa de doutorado ou em cargos profissionais elitizados, ela está presente na essência das pessoas e pode se manifestar em diferentes qualidades.


Foi a partir de pensamentos como esse, que estudiosos passaram a defender uma educação que foge do padrão prova, nota e boletim. No olhar do educador português José Pacheco, referência mundial na área da educação, o ato de imitar é a base aprendizagem, o que explica as crianças reproduzirem o ambiente que as cerca.


“A gente aprende o outro, por isso as pessoas que convivem com as crianças devem manifestar valores positivos, sobretudo o amor”

Já o filósofo inglês Robert Fulfhum, defende as experiências vividas no parquinho de areia como base da psicologia de cada pessoa. No livro Tudo que deveria aprender na vida está no jardim de infância, ele faz análises do mundo infantil e as compara com atos de gente grande.


“Pense na sementinha de feijão, plantada no copo de plástico: as raízes vão para baixo e para dentro, e a planta cresce para cima – ninguém sabe como ou por quê, mas a verdade é que nós também somos assim”, cita na livro.


Educação exemplar
Criador da Escola da Ponte, que fica no distrito do Porto, em Portugal, José Pacheco lutou para provar suas ideologias. “Há 40 anos, a Escola da Ponte era uma escola que ninguém queria, que ninguém desejava ir para lá”. Porém, hoje, o colégio que idealizou é visto como um marco pedagógico e exemplo educacional para o século 21. A instituição pertence ao ensino público português e é reconhecida mundialmente pela proposta inovadora, que visa, acima de tudo, à felicidade das crianças.

No início da formação, Pacheco também trabalhava com o método tradicional. Mas, depois de muitas reflexões e estudo, chegou à conclusão de que os pequenos não absorviam o conteúdo do jeito que os professores queriam, porque as aulas tradicionais não seguem a essência da aprendizagem, a naturalidade.


"Uma escola com propostas de século 19 não pode funcionar no século 21" , José Pacheco
                                                                                       Foto: Creative Commons

“A cultura diz que o professor precisa ser contente e ético. Ele pode ser feliz por gostar do trabalho, mas se a aula dele não ensina a todos, precisa reconhecer que não pode continuar assim”

Agora, a reconhecida escola de Pacheco não tem paredes nem portas como divisores de ambiente, o que divide o aprendizado é a área de interesse de cada um e o grande lema é felicidade.  Já a gestão, é feita pela comunidade local, com assembleia de estudantes, associação de pais e outros grupos, que guiam os programas culturais de funcionamento.

“Somos uma organização social de aprendizagem, que é uma comunidade”

Hoje, Pacheco mora em Brasília e diz que no Brasil existem escolas que se assemelham à essência da instituição que idealizou. Ele, que viajou o mundo e  estuda as escolas brasileiras, diz que o país tem os melhores projetos educacionais.

“Eu não quero que as escolas brasileiras sejam como a Escola da Ponte, porque ela não é um modelo, é uma inspiração”

                                                                             A arte é a raiz da educação
                                                                                       Foto: Íris Cruz

Segundo ele, é preciso que as escolas se configurem na prática e na posição dos professores, para acompanhar o crescimento individual de cada aluno e ser um exemplo de autonomia e solidariedade.

“Quero professores atentos e responsáveis, que correspondam à cultura local e às necessidades sociais”
Como explica Pacheco, a escola pode atender as necessidades individuais e o crescimento pessoal dos estudantes se trabalhar com equipe de projetos, “O professor em sala sozinho é um escândalo; um professor sozinho não pode responder cada um do alunos, porque ele é um indivíduo e transmite o que ele é”

Na visão do educador, é preciso fugir de um modelo que transmite infelicidade, em que professores estão doentes e alunos não aprendem. “Uma escola com propostas do século 19 não pode funcionar no século 21”. A organização de se ter uma única pessoa em sala, com alunos, mesas e lousas, é um modelo de educação ultrapassado e inaceitável para atualidade.
O aprendizado pode se dar até em uma floresta, o importante é que siga a naturalidade. “Podemos aprender em qualquer lugar, desde que haja a interação de um tutor que acompanhe o aprendiz e a produção do conhecimento”. Segundo Pacheco, uma loucura se apoderou do poder governamental e das secretarias de educação, que não enxergam os valores de humanização, complementariedade e colaboração.

“Numa aula nada se aprende, numa prova, nada se prova; O Brasil tem tudo que precisa para construir uma nova rede de aprendizagem, mas a responsabilidade está nas mãos de quem gera”

Pedagogia Waldorf
Baseada nos princípios da antropofasia, a pedagogia Waldorf Livre trabalha a união entre o crescimento físico, espiritual, intelectual e artístico das crianças. Exemplo de educação que foge dos padrões tradicionais, a pedagogia segue a ideologia de Rudolf Steiner. Em 1919, ele fundou a primeira escola que responde aos conceitos da ciência espiritual.

Hoje, por mais que corresponda aos ideais de Steiner, concretizados há quase 100 anos, a pedagogia ainda é vista como alternativa aos métodos tradicionais. O que, como explica José Pacheco, mostra mais uma vez como o ensino adotado pelas escolas tradicionais é retrógrado e inadequado para a realidade do século 21.
Por meio de atividades lúdicas, que utilizam a relação corpo e alma para transmitir o conhecimento, os professores apresentam o conteúdo de um jeito alternativo, expondo a realidade e fazendo com que os alunos cheguem às próprias conclusões.

Em Brasília, as escolas Moara e Jardim Pequizeiro adotam o método da pedagogia Waldorf
     Foto: Escola Moara/Divulgação

“Quando me profissionalizei na área da educação, vi como está defasada e não contempla o que acredito em relação ao ser humano”, conta o educador Paulo Nascimento, hoje especializado na pedagogia Waldorf.

Segundo o professor, a vontade em trabalhar com uma visão do conhecimento integral, que abrange aspectos físicos, cognitivos, sociais e espirituais o fez se interessar pelos estudos de Rudolf Steiner e dar aulas que valorizam o emocional.

“Diferentemente do ensino tradicional, que é materialista e só visa o vestibular, a pedagogia Waldorf traz a integração do ser humano e por isso me encantei”

                                                A educação deve ser vivenciada do jeito mais natural possível
                                                                                        Foto: Íris Cruz

Como explica Paulo, se a criança for obrigada a aprender algo que ela não esteja preparada para entender, isso vai tirar forças dela, e a energia que deveria ser utilizada para o desenvolvimento físico no período da alfabetização, por exemplo, vai passar a ser desviada apenas para o intelecto, prejudicando-a por completo.

“Valorizar o tempo dela é preservar a saúde e o gosto pelo aprendizado, por isso o ensino na pedagogia Waldorf é uma respiração”
Já que nasceu na Alemanha, mas está presente em mais de 60 países, a pedagogia se adaptou a cultura de cada lugar. Segundo Nascimento, os educadores precisam ser abertos e falar fielmente sobre os fenômenos na natureza.
No olhar do professor, a cada aluno que chega de um ensino tradicional, em pouco tempo na metodologia dita alternativa, percebe-se uma vivacidade maior e um desenvolvimento pessoal muito grande.

“Recebo muitas crianças durante o percurso e percebo uma mudança no termo de vivacidade, por meio de práticas corporais e observação da natureza. As práticas artísticas permitem esse aflorar maior de emoções, então a criança fica mais solta, espontânea e viva”

Palavras dos pais

Mãe de Samuel, de 14 anos, e Nicolas, de 10 anos, Luciana Hora Acioli tirou os filhos do ensino convencional por acreditar que a educação não deve seguir padrões únicos e precisa se adaptar ao íntimo de cada criança. Hoje, Samuel e Nicolas estudam com a metodologia Waldorf e para a mãe essa escolha faz parte da receita da felicidade.


“Meu filho mais novo tem síndrome de Asperger e não se adaptou ao ensino tradicional; mas, na verdade, foi o ensino tradicional que não se adaptou a ele”


Depois de enfrentar grandes barreiras em escolas tradicionais, descobrir um lugar que acolha o filho e respeite seu ritmo de aprendizado fez toda a diferença no desenvolvimento de Nicolas.

“Nas primeiras semanas de aula na nova escola, ele olhou pra mim e disse: mamãe, eu me sinto confortável. Essa foi minha maior felicidade”
Segundo Luciana, o clima descontraído na apresentação dos conteúdos desbloqueou o problema de expressão do filho que, assim, desenvolveu outras habilidades, principalmente na área das artes.
Pintura de crianças da escola Moara
 Foto: Escola Moara/ Divulgação

“Na infância a gente descobre o mundo e a maneira como a gente o descobre define tudo lá na frente, na vida adulta”

Com olhar maternal, ela fala que se os pais inserirem os filhos em um sistema de condicionamento, as crianças não vão ser estimuladas a ter um espírito pesquisador e curioso.

“Tudo o que a gente aprende no jardim de infância influencia no nosso aprendizado lá na frente”
André Barcelar é pai de Alice, de 10 anos, e Miguel, de 8 anos.Ele optou em educar os filhos longe das escolas tradicionais por acreditar que o ensino convencional causa traumas nos pequenos.

“Queria uma pedagogia que respeitasse o brincar e estimulasse a autonomia”, conta. A escolha de Barcelar também foi a pedagogia de Rudolf Steiner, que embora não seja moderna é uma alternativa ao ensino repressor.

“Pra mim, a educação não é só professor e aluno, é tudo que está em volta da gente. Essas escolas tradicionais não têm compromisso com a educação não, educar é muito diferente do que assistir aulas”

Casa das palavras

No programa Casa das palavras, da TV Câmara, os jornalistas Roberto Seabra e Paulo José Cunha falam sobre literatura. Entre tantos escritores e leitores de referência nacional e internacional entrevistados, eles também conversaram com José Pacheco, que ilustrou o futuro e a realidade das escolas brasileiras. Confira a reportagem:




Documentário

Lançado em 2014, o documentário Sinto que já sei expõe práticas educacionais inovadoras adotadas por escolas brasileiras. Nele, o  cineasta Antônio Lovato mostra que as instituições de ensino devem ser lugares lúdicos, para estimular o sorriso.




Veja aqui uma seleção de escolas ao redor do mundo que se destacam na arte de inovar.

Por Íris Cruz