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Jejum como estilo de vida

As pessoas perdem peso, mas também estão sujeitas a riscos, principalmente se não tiverem orientações individuais de especialistas

Luiz Neto na primeira refeição do dia. Ele almoçava com o colega Wesley Arantes


É comum ficar algumas horas sem comer, quado se tem algum exame de sangue no outro dia. Na correria do cotidiano, também é comum não comer o quanto você gostaria, pois o trabalho e os filhos tomam bastante tempo. Mas e ir almoçar com os amigos e não comer nada? Na festa de família, no domingo ou no barzinho com os amigos na sexta-feira à noite, não comer por escolha própria? Pois é, há pessoas que passam por essas situações, e tudo isso em prol de uma escolha de alimentação chamada Jejum Intermitente, que consiste em alternar períodos de alimentação com períodos de abstinência. Estudos relatam vários benefícios para dar mais qualidade de vida. Mas essa dieta, como qualquer outra, deve ser acompanhada por um profissional, sob o risco de ter efeitos indesejados e até problemas de saúde.

Imagine o seguinte: você prepara as refeições normalmente, faz o prato da sua filha e pede para ela se sentar à mesa para comer, mas você não vai comer com ela, nem agora, nem durante as próximas 36 horas. Esta é a rotina de Ernesto Albuquerque e Kelly Albuquerque, que ficam sem se alimentar de 21h do domingo até 9h da terça-feira, todas as semanas. O casal começou o jejum intermitente há seis meses. Ernesto já perdeu 7 quilos e Kelly 8. 

A nutricionista Thais Trivelato explica que a prática é uma forma eficaz de perder peso e gera outros benefícios: aceleração do metabolismo, melhora do quadro hormonal, maior sensação de saciedade, melhora na reparação celular (autofagia), redução da resistência à insulina, redução de triglicerídeos e colesterol, regeneração muscular e, em alguns quadros, a diminuição do crescimento de tumores. A profissional entende que cada indivíduo tem particularidades e rotina, tudo isso deve ser levado em consideração ao aderir a qualquer dieta. ”Não pode seguir o que aparece na internet ou seguir uma dieta só porque um artista está fazendo, isso pode acabar até te prejudicando”. Seguir padrões na internet, mesmo que de profissionais de saúde, foi uma história em comum por entrevistados para esta reportagem, o que não é indicado.

No entanto, crianças, adolescentes, grávidas, diabéticos e idosos não devem fazer jejum intermitente em hipótese alguma sem consultar um profissional, afirma a nutricionista. “A prática tem que ser supervisionada por um nutricionista ou médico. Pode haver efeitos negativos como falta de energia, fraqueza, quadro de desmaio, perda da massa muscular, irritabilidade, desânimo, cansaço, queda na pressão arterial, queda na imunidade do organismo e, em casos extremos, pode levar à morte”. A prática  não é indicada para atletas ou para quem deseja um corpo definido e ganho de massa muscular.

"Pietra (filha do casal) come normalmente, se ela quiser fazer o jejum também será uma decisão dela no futuro" afirma Ernesto.


Devido aos benefícios, Ernesto e Kelly pretendem adotar o jejum como um estilo de vida. O casal descobriu a dieta no Instagram, lá um nutricionista que eles seguem escreveu uma matéria a respeito do JI e eles resolveram começar. “Eu já tinha tentando dietas e como tenho hipotireoidismo, tinha muita dificuldade em conseguir baixar de peso. Com o jejum intermitente e o remédio, minha tireoide se mantém regulada e finalmente consegui perder peso e manter” conta Kelly. Ambos fazem musculação cinco vezes por semana e boxe duas vezes, e relatam que o jejum não atrapalha essas atividades. 

O servidor público Luiz Neto, 39 anos, também começou a dieta há seis meses como um complemento ao estilo de alimentação chamada Low Carb High Fat - LCHF (Baixo Carboidrato e Alta Gordura). “Durante a semana, faço cinco dias jejum de 16h. Parece difícil, mas não é. Janto por volta de 20h e só volto a comer as 12h do outro dia. Não tomo café da manhã tradicional por não ter fome, bebo apenas café preto sem doce. Isso inibe o apetite e dá energia”, relata o servidor que eventualmente faz jejuns de até 28h.



Luiz Neto afirma que ambas as medidas são mais benéficas ao organismo do que comer a cada três ou quatro horas, e que os exames, a cada três meses, mostram o estado de saúde. Ele conta que pratica atividades físicas como, futebol corrida e musculação para manter a forma física. “Foi um processo gradual, aos poucos aumentei as horas sem comer e nunca interferiu no meu dia a dia”.

Dion Farias, 51, que também é servidor público, conheceu o estilo de alimentação na internet por meio do Blog de um médico. Ele conta que foi uma transição bem tranquila, geralmente só tomava um café pela manhã e só comia no almoço, então aos poucos aumentou até 16 horas no cotidiano. “Já fiz jejum de 24h, 36h e 48h, o que foi um desafio psicológico, e agora estou querendo ficar 5 dias sem comer... Isso é fantástico porque não me preocupo com o que vou comer. Sinto fome, mas é algo rápido, um copo de água, café ou chá já resolvem o problema, acho uma liberdade incrível e me dá uma sensação de ser sobre-humano”.

Dion explica que para ele é mais fácil fazer o jejum do que comer e não precisa se preocupar em o que comer, onde comer, comprar, guardar e preparar. Em mais de um ano de JI ele diminuiu a circunferência do abdômen de 94 cm para 88,2 cm. Na academia em que faz musculação a medição da gordura corporal fica em torno de 15%.

Os entrevistados recomendam a dieta para quem busca perder peso ou uma vida mais saudável, e afirmam que não é um sofrimento como as pessoas imaginam. Com o tempo a fome diminui e o corpo se acostuma.

O nutricionista Victor Machado afirma que existem estudos que confirmam os benefícios do estilo polêmico de alimentação, mas não significa, segundo o profissional, que se resume a simplesmente ficar sem comer. “As pessoas no Brasil faziam jejuns. O normal era café, almoço e jantar, mas o problema é fazer refeições exageradas, comer muito. Além disso, beber, fumar e ser sedentário fazia as pessoas engordarem... Tem que se alimentar sem exageros, fazer atividades físicas e evitar os vícios, assim o indivíduo vai conseguir uma vida mais saudável”, aponta o especialista.

Autofagia, Nobel e Jejum

No começo de outubro, o japonês Yoshinori Ohsumi recebeu o Prêmio Nobel de Medicina pelas pesquisas referentes ao processo de autofagia, um processo natural que acontece no organismo animal e consiste em reciclar as células velhas, que mesmo sem função continuam no organismo.

Victor explica que ficar períodos sem se alimentar estimula a regeneração celular através da autofagia. Ao fazer o jejum, o corpo procura fontes de energia nos estoques de carboidratos, gorduras, glicogênio até chegar às células que irão comer as próprias organelas. Com isso, as células perdem função e o organismo é forçado a eliminá-las e criar outras para substituí-las. “Esse é um processo que mantém as células em constante renovação e torna o metabolismo mais saudável. Apesar de esse processo ser natural ao corpo, se o jejum for feito de forma inadequada, pode simplesmente digerir as organelas das células e não substituí-las”, aponta o nutricionista.


Por Elvis Costa