De um
lado, profissionais veem que rede não tem como garantir uma consulta para gerar
uma prescrição de emergência. De outro, especialistas temem banalização da
distribuição. No DF, postura ainda é cautelosa
O protocolo anunciado pelo
Ministério da Saúde, que será publicado em outubro, de garantir a pílula do dia
seguinte sem receita médica já gera diferentes práticas nos postos de saúde do
Distrito Federal. Foram consultadas pela reportagem do Esquina 15 unidades de
diferentes bairros de Brasília e de regiões administrativas. Em apenas um
deles, na Asa Norte, foi dispensada a receita médica para retirada do
medicamento. "Cuidado! Tem que usar a camisinha e não pode utilizar sempre
a pílula do dia seguinte", recomendou a médica. Em todas as outras,
enfermeiros ou médicos disseram que a pílula de emergência somente é liberada
se a pessoa interessada trouxer a prescrição de um médico em mãos. Entre as
defesas da proposta, o ministério apontou que essa dispensa de receita já
ocorria informalmente em várias unidades pelo país. Outro argumento é de que a
mulher pode não ter condições de esperar por uma consulta, já que o remédio com
carga extra de hormônio deve ser tomado em até 72 horas após a relação sexual.
O "protocolo para
utilização do levonorgestrel na anticoncepção hormonal de emergência",
como o documento foi batizado, é avaliado desde abril por especialistas
convocados pelo governo. O ministério informou que distribuirá mais de 100 mil
exemplares para unidades em todo o Brasil e o conteúdo será disponibilizado na
internet. O governo faz questão de enfatizar um dos itens do protocolo: os
enfermeiros poderão entregar a pílula de emergência sem a receita médica, nas
unidades básicas de saúde e dentro dos programas do ministério, desde que, em
seguida, encaminhem a paciente ao programa de planejamento reprodutivo. "A
pílula não pode se tornar um hábito. Por isso, a paciente deve ser recebida
pelo sistema de saúde", disse uma especialista ligada ao ministério.
Servidores da saúde local
manifestaram informalmente apoio à ideia do protocolo do Ministério da Saúde.
"Por se tratar de um contraceptivo emergencial, não tem sentido ser
necessária uma receita. Se você for ao posto querendo uma pílula, você tem que
sair de lá com ela, independente da sua idade ou do motivo", explicou uma
fonte. No entanto, o assistente do Núcleo de Assistência Integral à Saúde da
Mulher no Distrito Federal, Frederico Coelho, em e-mail enviado ao jornal,
defendeu inicialmente a necessidade da prescrição. "Ressaltamos que a prescrição
da contracepção de emergência pelo médico ou enfermeiro agiliza e dá pronto
acesso das usuárias ao medicamento, além de dar maior proteção a estas".
Porém, após ter conhecimento da publicação do protocolo, garantiu que a
secretaria irá se adequar ao que foi recomendado pelo ministério.
Um dos postos visitados pela
reportagem foi o Centro de Saúde número dois, situado no Varjão. Ao perguntar
para os recepcionistas sobre como adquirir uma pílula, a equipe foi encaminhada
a uma farmácia, localizada no próprio Centro de Saúde. A enfermeira responsável
pela triagem dos pacientes, Sandra Xavier, afirmou que o remédio só é
distribuído com a receita em mãos. "O medicamento só pode ser entregue
depois de consulta e avaliação com um ginecologista", explicou. Feito isso,
o medicamento pode ser retirado no próprio posto e não é realizado um
acompanhamento médico após o uso. Segundo Sandra, essa é uma norma da
Secretaria de Saúde a todos os postos. A enfermeira ressaltou que a receita possui
duas vias, uma fica com o paciente e a outra com o Centro de Saúde.
Especialistas
- Para o ginecologista José
Domingues, 52 anos, a pílula é um método de exceção que não deve ser usado com
frequência. "Aconselhamos a não tomar porque existem métodos mais
eficazes, porém quando é um caso emergencial, não há outra forma",
explicou. O ginecologista ressaltou que a pílula não é abortiva, mas tem uma
alta dosagem de hormônios que podem causar enjoos, mal estar, inchaço,
sangramento e até mudança no ciclo menstrual. "Cada corpo reage de uma maneira,
mas esses são os efeitos colaterais mais comuns", enfatizou Domingues.
Para a ginecologista Eide dos
Reis, 37 anos, não existe nenhum método contraceptivo que seja 100% seguro.
"As mulheres que buscam tomar anticoncepcional, geralmente tem relações
sexuais frequentemente e querem se prevenir, mas ainda assim não é totalmente
seguro", explicou. Eide só aconselha a pílula no combate a uma gravidez
indesejada em casos de uma relação sexual de risco, como estupro e falha de
outros métodos contraceptivos.
A ginecologista opinou sobre a
necessidade de prescrição médica para a pílula. "A ideia é boa, desde que
seja de uma forma controlada e que tenha uma orientação no momento da
distribuição", afirmou. Eide ressaltou que o uso abusivo da pílula pode
causar uma série de interferências no organismo da mulher. "A pílula
provoca uma menor movimentação das trompas, bloqueia a saída do óvulo do ovário
e causa a descamação do endométrio". A ginecologista explicou que com o
uso do medicamento em excesso, a mulher pode engravidar, pois o uso
indiscriminado quebra o ritmo hormonal, fazendo com que a pílula perca seu
propósito de prevenção de uma gravidez.