Marmitas vendidas no Setor Comercial Norte Foto: Kamila Siqueira |
Por Jamile Rodrigues
Na cidade em que o almoço fora de casa custa em média R$ 31,77 (segundo pesquisa do Datafolha e da Alelo), vendedores oferecem marmitas com valores que variam de R$ 5 a R$ 10 em centros comerciais nas Asas Sul e Norte.
Alguns vendedores fazem ‘‘promoções’’ nas vendas, o
que incluem saladas, refrigerantes e sobremesas como acompanhamento das
refeições. A vendedora Leidiane Lima, 25 anos, oferece marmitas todos os dias
no Setor Comercial Sul. Quando o cliente compra uma marmita por R$5, ele leva o
refrigerante em lata, de graça. ‘‘Aqui a concorrência é bem grande, então a
gente tá sempre mudando o cardápio. Damos o refrigerante de graça,
porque mais pessoas vêm comprar’’, contou a vendedora que se identificou como
Leidiane. Ela começou a vender as marmitas por influência de uma amiga.
‘‘Eu estava desempregada e uma amiga me falou do
dono de um restaurante que estava precisando de gente para vender os almoços
por aqui”. Ela ganha R$ 150 por semana, alimentação e passagem. “Geralmente, eu
fico das 11h30 até às 15h, depois tenho a tarde livre’’ finalizou.
Por volta das 11h, nos arredores da Rodoviária do
Plano Piloto, foi possível observar uma menor de idade chegando acompanhada de
um rapaz, aparentemente da mesma idade que ela, carregando uma caixa de isopor.
Os dois colocaram a caixa em um banco, ela se sentou próximo enquanto o garoto
saiu.
Quando notou que a equipe do Esquina On-line
estava se aproximando, logo abriu a caixa, e exclamou: ‘‘vai uma marmita ai,
dona?’’. Esse é o dia-a-dia de Maria*, de 15 anos. Todos os dias, ela e o
primo, trazem as marmitas feitas pela avó, do Setor P Sul, bairro da região
administrativa de Ceilândia até Brasília.
‘‘A gente vendia bala, picolé e outras coisas, mas
depois que um monte de gente começou a vender marmita, a gente quis mudar
também’’, expressou a menor com desconfiança. Esse não é um caso isolado,
diversas crianças ocupam os arredores da Rodoviária e dos Setores Comerciais
Sul e Norte para vender doces, produtos piratas e quentinhas. ‘‘Eu não estou
estudando não. Preciso ajudar em casa, então venho vender marmita’’, desabafou.
O estudante Marcos Rocha, que trabalha no Setor
Comercial Norte, recebe R$ 9 de vale-refeição por dia. Como o preço dos
restaurantes vai além do orçamento, Marcos optou pelas quentinhas. ‘‘Eu prefiro
comprar as marmitas, já que o rapaz aqui vende por R$ 5. O que sobra do
benefício, eu misturo com o salário do mês’’, afirmou o estudante.
Um rapaz que preferiu se identificar apenas como
Carlos, e não relevar a idade começou a vender marmitas para ajudar em casa.
Ele contou que trabalhava em uma empresa, porém ao ser demitido, ficou
preocupado com a situação. A solução surgiu através da avó, que gostaria de
vender algo. Decidiram então que ela passaria a cozinhar e ele iria para a rua
vender.
As conhecidas “Quentinhas da Vovó” são vendidas
pelo preço de cinco reais e têm um cardápio para cada dia da semana. Porém,
Carlos calculou que o preço não deveria ser esse. “O valor dessa marmita tinha
que ser R$7, mas como a concorrência é grande e tem gente que vende a R$ 6, com refrigerante, acabo fazendo por R$ 5”.
Carlos e a caixa de isopor com as marmitas vendidas no Setor Comercial Sul
Foto: Kamila Siqueira
Fiscalização
Carlos diz que uma das maiores dificuldades é lidar
com a fiscalização. “Quando os fiscais batem, todo mundo corre. Já tive
mercadorias apreendidas algumas vezes”, desabafou.
De acordo com a assessoria de imprensa da Agência
de Fiscalização do Distrito Federal (AGEFIS), os fiscais percorrem trechos dos
setores comerciais todos os dias, para verificar a incidência de ambulantes. Os
representantes da AGEFIS recolhem as mercadorias, desde materiais piratas a
alimentos. Conforme foi informado, depois de apreendidas, as mercadorias vão
para o depósito do órgão. Os responsáveis por esses materiais devem ir até lá,
pagar pelos custos. Em geral, o alimento é incinerado. Ninguém vai preso, mas
se os ambulantes apresentarem resistência, eles podem ser levados à delegacia,
para prestar esclarecimentos.
Para a auditora de atividades
urbanas da ANVISA, Regina Alice, as pessoas devem tomar o máximo de cuidado com
o consumo desse tipo de alimentação. Segundo ela, não há fiscalização própria
para esse tipo de trabalho, então nunca se sabe em quais condições essa
refeição foi preparada.
‘‘Essas marmitas não estão na
competência da Agência, então não existe um controle sobre elas, os
restaurantes tem fiscalização periodicamente, por isso é mais adequado que as
pessoas comam nos locais fiscalizados’’ declarou.