Presidente da Associação Brasileira de Motéis
explica que a higienização de uma suíte precisa ser encarada como uma ciência
Quarto de luxo do motel Paradise recém utilizado
Sexo. As opções de
quartos temáticos estimulam a imaginação desde a entrada. Um balcão “fantasma”,
sem contato visual e o mínimo diálogo possível fazem tudo parecer um
mistério. Por trás de todo contexto erótico estão corredores com cheiro de
hospital, funcionários rápidos na limpeza e no
atendimento.
Cada empregado possui um carrinho com o kit para higienizar as suítes. “Tenho em
média de 15 minutos para fazer a limpeza de todo quarto. Começo a minha parte
pelos banheiros tirando o lixo e depois passo cloro principalmente no vaso
sanitário”, explica Anita Brito, 39, funcionária do motel há seis anos. Ela é
uma das noventa da rede e considera a profissão essencial.
O motel ministra
cursos de três em três meses para atualizar os funcionários sobre os cuidados
com limpeza. Renata Piza, formada em química e consultora da empresa, é
responsável pelos cuidados com os produtos químicos. Ela destaca que, dentre os usados, estão o detergente neutro e alcalino, desinfetante, desincrustante,
solução clorada, limpa-vidros, sanitizante e álcool a 70 graus GL. “Nosso
procedimento de higienização é parecido com o que é utilizado em hospitais, e todos os funcionários devem vestir luvas e botas
por motivo de segurança.”, pontua.
Experiência
A
publicitária Marina*, 26, gosta de frequentar motéis para apimentar o
relacionamento, mas confessa que passou por experiências constrangedoras.
“Já encontrei barata no quarto e chiclete mascado no cinzeiro. Isso me deixou apreensiva quanto à qualidade da limpeza
do ambiente”, explica. Marina contraiu candidíase, uma espécie de fungo nas
partes genitais, e acha que pode ter sido contaminada depois de uma aventura em um dos motéis da cidade.
“Eu não confio 100% na limpeza de nenhum. Por conta de experiências
negativas, hoje frequento bem menos”, desabafa.
Há 31 anos o gerente Francisco Novaes, 57, se dedica a cuidar de dois dos motéis pioneiros em Brasília: Paradise e Vegas, no Núcleo Bandeirante. Segundo ele, os gastos com a limpeza nos negócios giram em torno de R$ 5 mil por mês, e os motéis juntos contam com 67 quartos, 46 funcionários e suítes que variam de R$ 50 a R$ 200. “Aqui os mais antigos treinam os mais novos, pois a limpeza deve ser criteriosa”, reforça. Os produtos utilizados incluem álcool, detergente e água sanitária. Lençóis e toalhas são lavados no próprio local.
Arte: Pauliann Barbosa
Há 31 anos o gerente Francisco Novaes, 57, se dedica a cuidar de dois dos motéis pioneiros em Brasília: Paradise e Vegas, no Núcleo Bandeirante. Segundo ele, os gastos com a limpeza nos negócios giram em torno de R$ 5 mil por mês, e os motéis juntos contam com 67 quartos, 46 funcionários e suítes que variam de R$ 50 a R$ 200. “Aqui os mais antigos treinam os mais novos, pois a limpeza deve ser criteriosa”, reforça. Os produtos utilizados incluem álcool, detergente e água sanitária. Lençóis e toalhas são lavados no próprio local.
Lençóis sujos na lavanderia do motel Paradise
Saúde
Quando
o clima esquenta, poucos pensam nos riscos que uma suíte pode gerar à
saúde. De acordo com especialistas, alguns micro-organismos sobrevivem em
superfícies por um longo tempo. O gonococo, causador da gonorreia, permanece ativo de um a três dias e o HPV até sete dias. Segundo a ginecologista Andreia Araújo, a contaminação em
quartos de motel é um risco para a saúde, não só dos usuários, mas também dos
funcionários. “O ideal é escolher lugares em que os materiais são descartáveis”,
pondera.
O perigo das suítes mal higienizadas não está somente na transmissão de
doenças relacionadas ao sexo. O infectologista e membro titular da Sociedade
Brasileira de Infectologia, Marcelo Bravin, fala sobre a importância de motéis
utilizarem métodos de esterilização com estufas para matar fungos, bactérias e
protozoários. “Doenças micóticas, doenças fúngicas e dermatites podem ser
transmitidas se não há esterilização apropriada de sandálias, por exemplo”,
explica.
O médico conta que há casos de contaminação por piolho. “O Phthirus
pubis, mais conhecido como 'chato', pode ser contraído sem grandes
dificuldades, pois fica nas fendas de algodão do lençol e até entre as
cerâmicas”, diz. Bravin explica também que doenças de pele, como a sarna,
podem ser transmitidas em roupas de cama e banho.
Fiscalização
Os Núcleos de Inspeção Sanitária das regionais de saúde fazem inspeções de rotina. Além disso, a Secretaria de Saúde informou que,
anualmente, ocorre uma ação especial na semana do Dia dos Namorados. Do ano
passado para cá, não houve penalidade nem interdição por infrações relacionadas à higiene.
De acordo com o Núcleo de Inspeção de Saúde do Núcleo Bandeirante, a
desinfecção dos quartos deve ser feita com produtos devidamente registrados e
rotulados pela Anvisa. Além de fiscalizar os estabelecimentos, o órgão
distribui cartilhas para auxiliar os gerentes a manterem o padrão exigido.
João
Carlos Martins, chefe do Núcleo de Inspeção de Saúde do Núcleo Bandeirante e
coordenador da fiscalização em motéis, trabalha há 31 anos na área e conta que a ação nos locais acontece, em média, três vezes ao ano. Também há situações de denúncias. “Nos últimos 10 anos houve cerca
de três casos de interdição total de motéis do Núcleo Bandeirante. O poder de polícia
administrativa é proteger a sociedade, já que eu também sou parte dela”,
comenta. Ele diz que quando há um problema generalizado no estabelecimento, há intervenção
total, mas quando é uma situação localizada, a intervenção é parcial. “A partir
daí é gerado um processo administrativo que pode acarretar em multa”, afirma.
A Associação Brasileira de Motéis (ABMOTÉIS) criou uma cartilha com um programa operacional padrão para
limpeza dos ambientes. Além disso, promove workshops para treinamento dos
funcionários. De acordo com Eusébio Ribeirinha, presidente da Associação, a limpeza de uma suíte precisa ser encarada como uma ciência “e não como
uma simples atividade desenvolvida por uma pessoa qualquer.” Ele relata que os
cuidados com a higienização se refletem, atualmente, na decoração e na parte externa
dos estabelecimentos, que estão adotando um estilo mais 'clean', sem letreiros
de neon. “Seja qual for o tamanho do motel, para que este trabalho tenha
qualidade, o treinamento é fundamental”, alerta.
Eusébio garante que se hospedar em motéis regulamentados é
seguro, pois todos seguem as exigências previstas pela fiscalização. “Quando um
estabelecimento é notificado por limpeza fora das normas estabelecidas pela
vigilância sanitária local, não há prejuízos diretos para a Associação, mas é
uma situação negativa para o setor moteleiro como um todo”, completa. Nesse
caso, o estabelecimento deve arcar com as punições e multas dos órgãos de
fiscalização competentes.
Justiça
O advogado trabalhista, Claudio Sampaio, pontua que funcionários de
motel têm direito a adicional de insalubridade -
benefício concedido a trabalhadores que são expostos a agentes nocivos à saúde.
“Há uma divergência jurisprudencial se esta insalubridade deve ser em grau
médio (dando direito a um adicional de 20% sobre o salário mínimo vigente), ou
de grau máximo, correspondente a 40% do salário mínimo”, comenta. Na avaliação do advogado, o motel deve, preventivamente,
munir os funcionários dos devidos Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) e,
caso ocorra um acidente de trabalho, expedir uma Comunicação de Acidente de
Trabalho (CAT) à Previdência Social.
* O nome usado é fictício para preservar a identidade da entrevistada.
Por Mariana Areias
Por Mariana Areias