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Uso de pílula do dia seguinte por adolescentes preocupa especialistas


Pílula desenvolvida para emergências é utilizada indiscriminadamente (Imagem: iStock)

"Perguntei pela camisinha, mas ele disse que não gostava de usar. No calor do momento nem pensei direito, deixei rolar". Essa é a lembrança que a jovem Flávia* tem da primeira vez que usou a pílula do dia seguinte, aos 15 anos, a pedido do então namorado. Durante 10 meses, foi assim que levaram o relacionamento - sem camisinha e com muita pílula do dia seguinte.

No colégio, as amigas utilizavam o método ocasionalmente. "Certa vez, uma delas ficou com medo da mãe encontrar a pílula e tomou os dois comprimidos de uma só vez", conta Flávia se referindo a versão fracionada do medicamento, que deve ser ministrada com diferença de 12 horas entre as duas doses. "A verdade é que ninguém sabia muito bem o que estava fazendo", diz a jovem.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) indica o uso da pílula do dia seguinte em situações emergenciais, como quando acontece rompimento da camisinha ou em casos de violência sexual. Apesar disso, estudos revelam que o método é mais comum do que se imagina entre os jovens. Em 2011, pesquisas realizadas pela Secretaria de Saúde constataram que 75% das meninas e 60% dos meninos já conheciam a pílula. No mesmo ano, o Portal Educacional verificou, por meio de questionário online, que 22% dos adolescentes entre 13 e 16 anos que perderam a virgindade nessa faixa etária utilizaram o método para evitar a gravidez. Cinco anos depois, especialistas declaram que ainda é necessário esforço para que os jovens entendam a importância do uso de preservativos.


A principal preocupação é que o método contraceptivo tradicional seja substituído pelo que deveria ser apenas circunstancial. "Há adolescentes que tomam porque acham mais fácil, mas não lembram que existem outros riscos além de uma gravidez indesejada, como doenças sexualmente transmissíveis", atesta a ginecologista Albertina Duarte.

A farmacêutica Joyce Batista já se acostumou com a presença de clientes mais novos perguntando pelo comprimido milagroso ao pé do balcão. Com menos de R$ 5 é possível comprar a versão genérica. A regularidade das visitas é tanta que ela já conseguiu estabelecer um padrão de vendas. "Deveria se chamar 'pílula do final de semana'", descontrai.

Segundo a vendedora, alguns jovens solicitam a pílula com tanta frequência, que a farmacêutica se vê na responsabilidade de tomar providências. "Tento conversar e mostrar que isso não é uma prática saudável. E eles me agradecem. Vejo que a maioria não tem muito conhecimento sobre isso", conta.

Nessas ocasiões, a balconista procura frisar informações importantes disponibilizadas pelos fabricantes. Ela destaca os efeitos colaterais provenientes da dose de hormônios até 20 vezes maior do que a quantidade presente na pílula tradicional. Além de sujeitas a vômitos, dores de cabeça e cólica, as mulheres que fizerem uso indiscriminado da substância podem apresentar alterações do ciclo menstrual e, em casos mais extremos, trombose.

Renata*, 17 anos, sentiu na pele as consequências do uso excessivo da pílula. Ela diz se arrepender da época em que tomava até duas vezes por mês. "Eu sentia muitas dores e o ciclo menstrual ficou todo desregulado. Meu organismo ficou uma bagunça", afirma. A consulta com o ginecologista esclareceu dúvidas e definiu a escolha do anticoncepcional ideal para Renata.

Confusão

Para especialistas, a participação dos pais é imprescindível para gerar um senso de responsabilidade em torno do sexo na puberdade. “O adolescente tende a ver o mundo apenas pelo prazer e não pela razão. Os pais devem abrir o olhar do jovem para esse aspecto”, diz a sexóloga Patrícia Silveira.

No caso de Aline*, 14 anos, o medo de que os pais tenham conhecimento sobre sua vida sexual ativa fez com que a jovem tomasse a pílula do dia seguinte escondida. "Tenho medo de pedir pra ir no ginecologista e eles desconfiarem. A gente nunca falou nisso, então tenho medo da reação deles", afirma em tom preocupado. Quando quer tirar alguma dúvida sobre sexo seguro, ela pergunta às amigas, todas da mesma idade.

No círculo de amigas, o assunto causou alvoroço. Ao serem indagadas sobre a participação da família, as reações variavam entre risadas em alto volume e um olhar de quem vê uma certa loucura na hipótese de perguntar para os pais qualquer coisa sobre sexo. "Acho que meu pai me joga da janela!", diz uma delas em meio a gargalhadas.

Tereza Cristina conversa abertamente sobre sexualidade com a filha de 12 anos. Mãe também de um menino de 8 anos, ela diz que o diálogo deve acontecer de forma natural, mas para isso é preciso que o filho se sinta a vontade para tratar de qualquer assunto com os pais. "Tem pai que prefere reprimir ou fugir das perguntas inconvenientes. Acho que isso só atrapalha na relação de confiança entre os dois", diz ela. 





*Os nomes foram alterados para preservar a identidade dos entrevistados.

Por Nathália Araújo